Narrativas da “vida em fuga”: a construção político-jurídica da condição de refugiado no Brasil
A estrutura política dos Estados, contrária aos deslocamentos, se vale de uma lógica humanitária
para categorizar vidas marcadas por êxodos. Para essa seleção de pessoas refugiadas, as
narrativas acerca da fuga e da vida manifestas nos pedidos de refúgio são geridas em forma de
decisão estatal a partir de diversas dinâmicas e práticas institucionais em torno do instituto
político-jurídico do refúgio. Assim, uma das questões que permeiam a administração da
população migrante são as disputas acerca de quem são as pessoas refugiadas. No Brasil, o
governo adota um regime de elegibilidade pelo qual produz dispositivos de classificação entre
tais sujeitos. Este processo de seleção recorre a análises de credibilidade da narrativa dos
sujeitos por meio de produção de critérios de verdade e de imputações morais, disciplinando
seus corpos, numa dimensão física e na sua subjetividade – seus movimentos, documentos,
sofrimento, memória, desejos. Como pano de fundo, vigora uma individualização da condição
de refúgio construída por dispositivos estatais de fixação de identidade. Assim, os processos
de seleção dos refugiados produzem técnicas de gestão da heterogeneidade das migrações,
tornando desiguais as narrativas sobre a vida e a legitimidade dos movimentos.
Aryadne Bittencourt Waldely