A legislação não aborda diretamente e nem regulamenta o ensino bilíngue no Brasil.
“Toda esta situação é um reflexo da nacionalização do ensino em 1938″, durante o Governo do Presidente Getúlio Vargas, explicou à Lusa a doutora em Educação Valquíria Renk, professora na Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Paraná.
A investigadora afirmou que o ensino em língua estrangeira (alemão, polaco, italiano, ucraniano, pomerano, japonês e outras), como acontecia nas escolas das comunidades imigrantes no Brasil (Rio Grande do Sul, Paraná e Santa Catarina), foi proibido e todos estes estabelecimentos de ensino foram fechados.
Um dos motivos da nacionalização do ensino no Brasil foi a ascensão do nazismo/fascismo na Europa, pois muitas escolas do sul do país ensinavam em alemão e italiano, devido à forte presença destes imigrantes nesta região.
De acordo com estudos de investigadores brasileiros, várias centenas de escolas comunitárias, sobretudo no sul do país foram fechadas neste período. O ensino de línguas estrangeiras (não maternas) só voltou a ser permitido depois de 1945.
“Em 1938, só Rio Grande do Sul existiam 106 escolas polacas”, disse o investigador Adriano Malikoski, que estuda o tema e agora está a tirar um mestrado em Educação pela Universidade de Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul. “Estas línguas foram mantidas oralmente, pois continuaram a ser utilizadas em casa, na igreja e no convívio social, até aos dias de hoje”, sublinhou Valquíria Renk.
De acordo com a investigadora, “somente os indígenas brasileiros têm assegurado, por lei, a integração das suas línguas maternas no ensino regular das escolas”.
“A legislação educacional brasileira deixa de abordar diretamente e regulamentar a oferta integrada, no mesmo ambiente escolar, do ensino bilíngue em língua materna e em uma língua estrangeira moderna, tanto para escolas públicas, quanto para escolas privadas no âmbito da educação básica”, segundo o conselheiro da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação (CNE), Francisco Aparecido Cordão, citado em nota do MEC.
Segundo Francisco Cordão, “em rigor, não está aberta diretamente a possibilidade do ensino bilíngue no ensino fundamental — 1.º ao 9.º ano – (…) mas nada impede que, a partir do mínimo obrigatório em língua portuguesa (…), os diferentes componentes curriculares sejam trabalhados em outro idioma, na perspetiva da interculturalidade e do multilinguismo”.
O conselheiro referiu ainda que, no ensino médio (10.º ao 12.º ano), “não existe a mesma aparente barreira” na legislação.
Através de pareceres do CEB/CNE, as escolas internacionais podem oferecer o seu ensino no Brasil na sua língua materna (francês, inglês, alemão, ou outras), obedecendo a normas muito específicas.
Existe também a possibilidade do ensino bilíngue em escolas que mantém a cooperação com um país estrangeiro, com duas cargas horárias diferentes, um período em língua estrangeira e outro período com o ensino em português (respeitando a carga horária mínima em português determinada na lei). Neste caso, as escolas são, sobretudo, privadas.
Os alunos brasileiros destas escolas são obrigados a frequentar os dois períodos.
Hoje, existem algumas escolas públicas brasileiras que estão a promover o ensino bilíngue, nomeadamente em cidades com forte influência estrangeira, apesar das restrições na lei para esta modalidade de ensino.
Normalmente, o ensino de línguas maternas é feito nestas escolas públicas em horários complementares ao currículo oficial em português.
(Observador – 28/03/2015)