O jornal francês ‘Le Monde’ denuncia as dificuldades encontradas pelos refugiados no Brasil.

Em sua coluna no jornal Le Monde datado desta sexta-feira (09/10), a jornalista francesa Claire Gatinois descreve o dia a dia dos refugiados sírios no Brasil: “raramente um conto de fadas”. Ao contrário dos cristãos sírios que chegaram da Síria no final do século 19 e no começo do século 20, os refugiados recebidos no país desde 2011 são muçulmanos, e nem sempre bem vistos pelos brasileiros.

Diante do drama dos migrantes que chocou o mundo, o Brasil se mostrou como uma terra acolhedora. “Estamos de braços abertos para todos os refugiados que quiserem trabalhar e viver em paz”, assegurou a presidente Dilma Rousseff em setembro. “É importante ter uma política que não seja xenófoba e que não deixe espaço às cenas que vimos”, reiterou, referindo-se à foto do menino Aylan Kurdi, morto em uma praia da Turquia.

De fato, o Brasil facilitou a entrada dos sírios em 2013 e, desde 2011, recebeu 2.077 refugiados, mais que que alguns países europeus. Citando a imprensa brasileira, a jornalista do Mundo lembra as raízes sírias do Brasil e indica que cerca de 50 mil sírios-libaneses eram contabilizados no país em 1920, mais da metade em São Paulo.

Recomeçando a vida no Brasil do zero, os sírio-libaneses fizeram fortuna no país. Ruas e praças levam o nome desses imigrantes que marcaram a megalópole. Um exemplo é a rua Taufik-Camasmie, filho de sírios formado pela prestigiada Universidade de São Paulo (USP) e primeiro cirurgião do Hospital Sírio-Libanês.

‘Esposas do Bin Laden’

Mas hoje a realidade é outra, lembra a jornalista que entrevistou um dos fundadores do Instituto de Reintegração do Refugiado, Marcelo Haydu. Não é raro que mulheres de véu sejam apontadas como “esposas do Bin Laden” ou “terroristas”, relatou.

Gatinois também entrevistou a família Al-Tinawi, que chegou à capital paulistana em dezembro de 2013. O pai, Talal, conta que, diferentemente da Europa, os refugiados não recebem ajuda em dinheiro no Brasil: “Aqui temos que nos virar sozinhos. Mas somos bem-vindos”, diz, ressaltando que a simpatia brasileira não é um clichê.

Talal é engenheiro, casado com Ghazal, com quem tem dois filhos, Riad, de 13 anos, e Yara, de 10 anos. Como seu diploma não é reconhecido no Brasil, ele não pode exercer sua profissão e tem o projeto de abrir um restaurante. “Cozinhar é legal, mas eu fiz longos estudos”, lamenta.

Muitas promessas

As promessas são muitas, mas as perspectivas estão longe de ser concretas. “Considerem o Brasil como sua pátria, como seu futuro”, disse Floriano Pesaro, secretário de Estado do Desenvolvimento Social, no dia 2 de outubro, durante o aniversário da Casa de Passagem Terra Nova, centro de acolhimento de refugiados em São Paulo. Pesaro lembrou que ele próprio vem de uma família de imigrantes italianos e prometeu aos filhos dos refugiados um grande futuro: “virar político, porque não?”.

Enquanto isso, histórias como a de Tulin Hashemi se multiplicam no Brasil. Ela fugiu de Damasco há cerca de oito meses, passou seis meses na Turquia e chegou há dois no Brasil. Ela vive com a mãe na favela do Vidigal, um dos locais mais baratos do Rio de Janeiro. Sem saber falar português, ela já foi a diversas entrevistas de emprego, mas não conseguiu, até agora, um trabalho.

(RFI – 09/10/2015)