Muçulmanos do ABC reúnem forças para ajudar refugiados sírios.
As notícias sobre os refugiados sírios que se lançam ao mar em busca de melhores condições em outros países estão chocando o mundo, naquela que é considerada pela ONU (Organização das Nações Unidas) como a maior crise humanitária desde a Segunda Guerra Mundial.
Segundo dados do Ministério da Justiça, o Brasil acolhe 2.097 refugiados sírios atualmente, sendo o maior grupo entre os migrantes que estão no País. Destes, há uma estimativa de que 100 pessoas tentam recomeçar a vida no Grande ABC, conforme informou a Wamy (World Assembly of Muslim Youth), por meio do Sheik Jihad Hassan Hammadeh, um de seus líderes na região.
De acordo com o Sheik Jihad a agonia dos refugiados não termina quando eles conseguem sair de uma zona de conflito e alcançar horizontes mais tranquilos. “Temos conhecimento de sírios que chegaram ao Brasil e foram abordados por supostas pessoas que estavam dispostas a ajudar, mas não passavam de ladrões, estelionatários que se aproveitaram da fragilidade destes refugiados para roubar seus pertences, aumentando ainda mais o desespero.” relata.
O Brasil é reconhecido internacionalmente como um país acolhedor, porém ainda encontra dificuldades em receber quem chega aqui com o status de refugiado. “O governo federal tem feito de tudo para facilitar a entrada dos refugiados, mas ainda falta muito”, lamenta o líder da comunidade.
Nessa ausência de um auxílio mais profundo, que poderia ser realizado pelo governo, se encontram todos aqueles que se comoveram com a causa síria e não medem esforços para ajudar os refugiados como podem. “É preciso dizer que nessas horas mais drásticas, as religiões abandonam suas diferenças e todas acabam se ajudando. Somamos isso à solidariedade do brasileiro, temos uma receita que ameniza um pouco o sofrimento de quem chega quase sem esperanças”, detalha o Sheik.
Assim como a Wamy, a Cáritas também é uma organização religiosa, que pertence à Igreja Católica e tem prestado apoio e recebido inúmeros refugiados sírios islâmicos.
Região
A comunidade muçulmana no Grande ABC conta com mais de 5000 integrantes e tem se intensificado seu empenho em auxiliar seu povo em meios as dificuldades. Quem tem condições acolhe os refugiados com moradia, outros oferecem emprego, alguns ajudam as crianças quem chegam sem rumo, dando estudo, roupas e alimentação. “O grande problema é percebermos que, por mais que ajudamos, eles nunca se sentirão em casa. Aliás, muitos chegam aqui sem saber onde estão seus familiares”, explica o Sheik Jihad, que também perdeu familiares nos infindáveis conflitos na Síria.
“Algumas prefeituras tem se mostrado muito solícitas com a causa síria, como São Bernardo, São Paulo, Guarulhos e Barretos, por exemplo. Através delas conseguimos pleitear algumas habitações, empregos e até auxílio médico para quem necessitasse”, contou.
O Diário fez contato com a Prefeitura de São Bernardo para saber de que maneira estão oferecendo auxílio aos necessitados sírios, mas não obteve resposta.
O Sheik ressalta que um dos problemas que faz toda essa ajuda não ser aproveitada de maneira mais efetiva é o mapeamento dos refugiados que chegam no País. Segundo o líder espiritual, o Brasil tem que ceder o passaporte como refugiado e não como turista.
“Fica difícil mapearmos os sírios em situação de refúgio. Recebendo o passaporte como turista ele não tem qualquer instrução de como agir. Se recebesse o documento como refugiado, as embaixadas os receberiam e poderiam dar as primeiras informações. Por isso, fica difícil ter um controle exato de quantos chegam precisando de cuidado básico, por exemplo”, diz.
A recepção do brasileiro e a facilidade de se entrar no país não faz com que o refugiado escolha o Brasil como primeira opção para tentar recomeçar a vida. Os sírios, por exemplo, acabam selecionando países vizinhos ou europeus para esquecer o passado de conflitos e perdas. “Os europeus dificultam ao máximo a entrada de imigrante em suas fronteiras, porém aquele que consegue entrar será imediatamente tratado como refugiado e receberá atenção especial do governo. Aqui no Brasil isso se inverte. É bem fácil entrar no país, mas as autoridades não tratam os refugiados, como refugiados”, relatou o Sheik
Infelizmente, assim como acontece em certos países da Europa, alguns refugiados sírios em terras brasileiras também tem encarado o fantasma da descriminação. “São poucos, mas há relatos (de descriminação). Carregamos alguns estigmas e tentamos lidar com isso da melhor forma”, desabafou o líder espiritual.
“Para que o Brasil desponte como uma das lideranças mundiais em acolhimento de refugiados, seja de onde quer que eles vierem, é preciso tomar alguma importantes ações. Sendo que o planejamento para receber as pessoas com este status é o primordial. É necessário haver união entre setores do governo e da sociedade para que se conversem”, conclui o Sheik.
Daniel Tossato
(Diário do Grande ABC – 16/10/2015)