Irmãos fogem de guerra na Síria e sonham com carreira pop no Brasil.
Refugiados no Brasil há dois anos, os irmãos sírios Limar Al Najem, de 7 anos, e Julman Al Najem, de 10, fazem aula de canto todas as semanas em uma escola em Taguatinga, região administrativa no Distrito Federal, para se prepararem para a gravação do primeiro CD. Fãs de Cristiano Araújo e Gusttavo Lima, os meninos afirmam que as dez músicas do primeiro álbum do “Syrian Boys”, que deve ser lançado em dezembro, serão predominantemente pop, com um pouco de rap.
A ideia de cantar surgiu depois que os meninos receberam um vídeo do ídolo Neymar. Fãs do jogador desde antes da chegada ao Brasil, os meninos tentaram entregar ao jogador uma escultura em tamanho real do astro do futebol quando a seleção esteve no DF na Copa do Mundo, em 2014. Esperaram na porta do hotel durante todo o dia, mas não conseguiram fazer a entrega. Neymar soube dos meninos pela mídia e gravou um vídeo desejando boas-vindas aos irmãos.
“Depois desse vídeo dele com os meninos, mandando essa mensagem, tivemos a ideia de fazer com eles uma mensagem voltada para a paz mundial e para a Síria”, diz Elciomar de Sousa, amigo da família que acolheu os sírios e se tornou produtor deles. “Uma parte é cantada em árabe, e foi escrita pela mãe deles. Queremos agora lançar o CD e ajudar eles a trilharem o caminho artístico que eles tanto querem.”
A ideia inicial era gravar apenas a música “Paz no mundo”, em português e em árabe. O professor de canto Denilson Dasthos abraçou a causa e, além de ensinar técnicas vocais, dá dicas de estilo para os meninos. Engajado com o projeto, o compositor Jow Brother escreveu outras nove músicas para o álbum, a maior parte com mensagens voltadas para crianças e adolescentes, que tratam de paz, escola, educação.
Guerra
A família Al Najem fez as malas às pressas para fugir para o Brasil quando a guerra na Síria completava dois anos. A mãe, Bássima, estava grávida quando deixou Jaramana, em Damasco, capital do país, e teve de ser levada ao hospital às pressas assim que desembarcou no aeroporto de Brasília, para dar à luz ao primeiro filho nascido em solo brasileiro.
“Quando a gente veio, a Síria já estava em guerra. Quando a gente chegou aqui, sabia nada”, diz Juman. “Só minha tia que estava aqui. Ela fala árabe e português. Ela ajudou a gente quando viemos”, diz ele. “A Síria antes muito boa, muito linda. Igual ao Brasil”, diz Bássima. “Agora, as casas todas quebradas, tudo caindo”, emenda Limar.
Os meninos lembram que se escondiam debaixo da cama quando ouviam o som de aviões sobrevoando a vizinhança. “A gente ficava com medo quando vinha bomba perto de casa. A gente ficava com medo que vinha na nossa casa,” diz Limar. O ateliê do pai, que é artista plástico e fez o boneco de Neymar, ficou destruído pelos ataques. Com a alta do dólar e o fim da guerra cada vez mais distante, a família decidiu passar uma temporada com uma parente no DF.
Bássima, que era professora na Síria, teve mais dificuldade que os filhos para aprender o português. Ela se comunica por meio dos meninos, que atuam como intérpretes. “Muito difícil”, diz ela sobre o idioma brasileiro. Para complementar a renda da família, ela vende comida árabe sob encomenda. O pai faz esculturas e produz porta-retratos e molduras.
Os irmãos dizem que sentem medo pelos avós e familiares que ficaram no país. “Sinto que estou com medo, porque meus avós podem morrer lá. Tem muita violência. Todas as pessoas que estão morrendo são inocentes”, diz Juman. “A gente está orando e pedindo para Deus que a guerra na Síria acabe, para que a gente possa voltar a fazer visitas.”
Isabella Formiga
(G1 – 05/11/2015)