A cientista política María del Carmen Villarreal Villamar explicou para oestrangeiro.org um pouco de sua pesquisa de pós-doutorado no Programa de Sociologia Política da Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF), realizada entre 2016 e 2017. Confira:

 

Quando pensamos nas migrações internacionais quase automaticamente consideramos apenas uma das suas expressões: a chegada de pessoas, isto é, a imigração e, com ela, a presença de imigrantes nas sociedades de recepção. Descuidamos assim, refletir sobre a saída de pessoas e sobre os protagonistas deste fenômeno, ou seja, a emigração e os emigrantes. Todavia, como dizia o sociólogo Abdelmalek Sayad (2010), a migração é um fato social total e deve ser pensada na sua integralidade, considerando a imigração e a emigração como duas dimensões do mesmo fenômeno.

Hoje, em um cenário global em que as migrações internacionais são um tema de interesse público e considerado sempre mais como um assunto de “alta política”, é necessário analisar, não apenas as políticas de imigração, mas também a importância da emigração para os Estados de origem, as relações que estes mantêm com os emigrantes e seus descendentes e a criação de políticas específicas para as “diásporas”.

Originalmente, o termo diáspora definia as expulsões e migrações forçadas dos judeus e de povos como os armênios que mantinham o mito do retorno à sua terra de origem. Hoje, o conceito é utilizado de forma mais ampla, como sinônimo de comunidades transnacionais. Para autores como Sheffer (2003), o conceito de diáspora serve para descrever de forma sintética as relações e redes de solidariedade e cooperação que os emigrantes e seus descendentes mantém entre si, e em relação ao seu país de origem. Tais relações podem acontecer nas esferas cultural, social, econômica ou política.

Acredita-se, por exemplo, que as diásporas possam contribuir a reduzir a pobreza e a gerar crescimento econômico e inovação através de ações como o envio de dinheiro (remessas), doações, abertura de novas empresas e crescimento das exportações, criação de redes de cooperação e transferência de tecnologia (Villarreal, 2017, 2019; Weinar, 2017). Este é o caso de países como a Índia, Israel e Coreia do Sul, onde o desenvolvimento econômico, a transferência de tecnologia e a abertura de polos de produção são resultado, em grande medida, da atuação das diásporas. Em casos de desastres naturais, emergências humanitárias ou processos de reconstrução pós-conflito, as diásporas do Haiti, Moçambique, Equador ou Líbano têm tido também um papel essencial.

As diásporas podem atuar também como um “lobby étnico” e exercer o papel de “embaixadores” simbólicos da nação de origem, promovendo uma imagem mais positiva, favorecendo o turismo, os investimentos estrangeiros e os interesses políticos e econômicos dos países de origem (Villarreal, 2017, 2019). Porém, não tudo é positivo e, no caso em que as relações com o governo do país de origem sejam tensas ou negativas, as diásporas podem também fomentar instabilidade política e inclusive contribuir ao financiamento de conflitos.

As políticas de vinculação com as diásporas são um aspecto central das migrações contemporâneas, mas não são um fenômeno completamente novo. No século XX, países como a Itália e a França, por exemplo, tinham diversas políticas para seus emigrantes, mas o interesse por estes grupos se multiplica nos anos 2000. Segundo o relatório sobre políticas migratórias do Departamento das Nações Unidas para Assuntos Econômicos e Sociais (DESA), o crescente interesse dos Estados de origem pelos emigrantes e seus descendentes provocou um aumento qualitativo e quantitativo das políticas criadas para este coletivo. Como exemplo, foram criadas diversas medidas para garantir a dupla cidadania dos emigrantes e seus descendentes, foi concedido o direito de voto para não residentes (voto extraterritorial), 114 Estados criaram instituições especializadas nas relações com as diásporas e 46 desenharam medidas específicas para atrair seus investimentos (DESA, 2013).

Em definitivo, em um cenário de profundas transformações e crescente mobilidade humana, conhecer a emigração e as políticas criadas respeito aos emigrantes e seus descendentes adquire cada vez mais importância e constitui um campo de prolíficas pesquisas a nível global.

 

Bibliografia

SAYAD, A. La doble ausencia. De las ilusiones del emigrado a los padecimientos del inmigrado. Barcelona, Antrophos, 2010.

DESA (Department of Economic and Social Affairs). International Migration Policies. Government Views and Priorities. Population Division, New York: United Nations, 2013.

SHEFFER, G. Diaspora Politics: At Home Abroad. New York: Cambridge University Press, 2003.

VILLARREAL, M. Replanteando el debate sobre migraciones internacionales y desarrollo: nuevas direcciones y evidencias. Revista Interdisciplinar de Mobilidade Humana (REMHU), 25 (51), 2017, pp. 181-198.

_________Relações Estado-diáspora. Os casos brasileiro e equatoriano. In ELHAJJI, M. e COGO, D. (orgs.). Interculturalidade, Comunicação e Migrações Transnacionais: Fronteiras, Políticas e Cidadania. Editora: Institut de la Comunicació de la Universitat Autònoma de Barcelona (InCom-UAB), 2019 (no prelo).

WEINAR, A. (Ed.). Emigration and Diaspora Policies in the age of mobility. Springer International Publishing, 2017.

 

María Villarreal

 

*María del Carmen Villarreal Villamar

Doutora em Ciência Política pela Universidade Complutense de Madrid. Pós-doutorado em Ciência Política pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO). Pesquisadora do Grupo de Relações Internacionais e Sul Global (GRISUL) e do Núcleo Interdisciplinar de Estudos Migratórios (NIEM)