Por uma política migratória comprometida com los derechos humanos.
A procuradora do Ministério Público do Trabalho, doutora em Direitos Humanos pela Universidade de Pablo Olavide (Esp) e autora do livro Direito de Imigração: O Estatuto do Estrangeiro em uma Perspectiva de Direitos Humanos, Cristiane Maria Sbalqueira Lopes publicou uma longa análise sobre a política migratória e direitos humanos na 13ª. Edição do Jornal Conexión Migrante (maio de 2012).

O artigo, intitulado Por uma política migratória comprometida com los derechos humanos, começa com uma tentativa de definição do significado do conceito de política – segundo o dicionário Houasis “uma série de medidas para obtenção de um fim”. Como se vê, sem uma continuação a palavra é vazia de sentido. O mesmo acontece quando se fala em “política de migração”. Qual a finalidade dela? Se não tiver uma resposta claramente declarada, será passível de várias interpretações.

A autora então cita exemplos possíveis de opiniões distintas a cerca do tema:

– O nacionalista diria que a política de migração deveria ser um conjunto de ações destinadas a restringir ao mínimo as migrações, para assegurar a manutenção dos usos, costumes e aparência do povo;
– O policial falaria da necessidade de garantir a segurança dos cidadãos;
– O comerciante insistiria na necessidade de proteger o mercado da competência desleal;
– O estudante de direito (que se lembre dos direitos fundamentais da Constituição Federal e alguma coisa de Direito Internacional), provavelmente diria: “Para mim uma política de migrações seria uma forma de administrar o direito de ir e vir, guiada pelas regras do direito internacional e respeito aos direitos humanos”.
– O militante das causas dos imigrantes destacaria que uma política de imigração deveria incluir uma agenda global de mudanças pontuais e estruturas necessárias para que o imigrante possa entrar, estabelecer-se e viver no pais escolhido sem ter mais dificuldade que em seus país natal, etc..

A autora lembra que o estatuto do estrangeiro deixa claro que o “objetivo da política é proporcionar mão-de-obra especializada aos vários setores da economia nacional, assimilação de tecnologia e captação de recursos” (artigo 16, parágrafo único da Lei 6815/80). Passa em revista, então, possíveis críticas daqueles que observam que essa lei é da época da ditadura e que não se aplica à realidade democrática nacional.

Cristiane M. S. Lopes logo salienta que o novo Projeto de Lei (PL 5655/2009) pouco avança nesse aspecto. Pois, segundo o artigo 4º da nossa possível futura lei, a política imigratória tem como objetivo primordial a mão de obra especializada adequada a diversos setores da economia nacional, o desenvolvimento econômico, social, cultural, científico e tecnológico do Brasil, a captação de recursos e geração de emprego e renda, observada a proteção do trabalhador nacional. Ou seja, não há avanço nenhum no registro dos direitos humanos!

Assim, o país segue e seguirá focado na imigração para ocupação dos postos de trabalho menos qualificados. Pois, supõe-se que a questão migratória seguirá sendo solucionada pelas regularizações periódicas – conhecidas como anistia, concedida de 10 em 10 anos. Mas, a verdade é que ainda há tempo para exigir uma política migratória diferente e mais em sintonia com o espírito dos direitos humanos.

É importante mostrar que há outras maneiras legais de entrar no país, sem ser pela política seletiva da anistia, tais como os acordos bilaterais, o MERCOSUL e a UNASUL – abriram valiosas portas para a livre circulação regional, com benefícios para toda a comunidade.

A autora pergunta então: “Por que não utilizar a integração regional (fortalecimento do multilateralismo) como um objeto da definição legal da política de imigração?”. Se o país é de fato comprometido com uma política de respeito aos direitos humanos por que não o declara diretamente?

O PL 5655/2009 sublinha que os direitos humanos orientarão a aplicação da lei, e isso supõe que os direitos humanos serão auto-aplicáveis, mas não é algo certo de acontecer. O que certamente é a realidade, o respeito aos direitos humanos é um desafio constante. Deve se lutar constantemente por eles, estar sempre vigilante para que o sistema (seletivo), a pequenez humana (egoísta, desinteressada, desinformada), o preconceito e a discriminação (contra o imigrante) não acabe por vencer a tentativa de sua implementação.

A autora aponta, então, algumas urgentes e necessárias para que o regime seja realmente comprometido com um trato justo aos imigrantes:

1. Participação política – por meio do reconhecimento do direito ao voto (para isso será necessário mudar a Constituição Federal);
2. Racionalização do processo de aquisição da nacionalidade;
3. Direito ao trabalho, priorizando o combate ao trabalho informal: estabelecer a possibilidade de regularização dos trabalhadores imigrantes sem traumas;
4. Gestão dos tramites administrativos: simplificar os tramites de residência e educar os funcionários da área;
5. Questões de gênero e família: disciplina da reunificação familiar, porque não é compreensível que alguns membros da família não tenham direito ao emprego por serem imigrantes.

Ela conclui que uma política de migração comprometida com os direitos humanos deve assegurar o direito de ir e vir, integração regional e promoção do desenvolvimento nacional.

Ruana Corrêa