Universitários estrangeiros almejam contratações vantajosas em empresas de grande porte.
A cultura e a beleza do Brasil fazem parte do sonho de muitos estudantes estrangeiros que desejam viver novas experiências. Além de buscar qualificação profissional, muitos jovens desembarcam no país com o objetivo de aproveitar cada oportunidade desse intercâmbio.
Enquanto alguns estudantes brasileiros vão para outros países trabalhar como garçons e babás, apenas com a intenção de aprender um novo idioma, os universitários estrangeiros chegam na América do Sul almejando contratações vantajosas em empresas de grande porte.
Por isso, a cada ano aumentam os incentivos das famílias e das instituições universitárias a favor desta “troca de experiências”, dado que a boa formação acadêmica somada à fluência bilíngue tornam-se quesitos definitivos para ascenção no mercado de trabalho.
Segundo o Ministério das Relações Exteriores, em oito anos o número de vistos concedidos para alunos estrangeiros mais que dobrou, passando de 5.770 para 12.547 emissões. E diante do quantitativo que aponta para o número de procura por nacionalidade, os colombianos, portugueses, franceses e angolanos lideram a lista dos estudantes que escolhem as cidades brasileiras como destino ideal.
Para a coordenadora da Belta (Brazilian Educational & Language Travel Association), Susanna Florissi, uma das razões pelas quais o país está em evidência no cenário acadêmico é o fator econômico.
“Durante muito tempo, o panorama universitário federal esteve fechado para a globalização estudantil. Porém, com o progresso das relações políticas, hoje o Brasil encontra-se em um patamar diferente e a alta do dólar beneficiou essa conexão.
Levando em conta os custos mensais associados à moradia, alimentação e transporte, muitos intercambistas consideram o nosso território mais atraente que os países de primeiro mundo. Além disso, os jovens que pretendem seguir carreira no setor de empreendedorismo avaliam a oportunidade como uma estratégia para aprender a língua e, futuramente, estabelecer algum tipo de negócio com as empresas brasileiras”, explica Susanna .
Atento às vantagens que a ação pode trazer para o âmbito econômico do país, o governo tem extremo interesse na ampliação dos programas de intercâmbio. Acredita-se que a medida é uma importante ferramenta para solucionar, em curto prazo, problemas como déficit de profissionais e aumento do custo da mão de obra qualificada. Esse é um dos motivos que explica o fato de muitos jovens estrangeiros permanecerem no país após o término dos estudos. Assim como acontece com os intercambistas brasileiros que garantem boas oportunidades no exterior.
Um dos planos do estudante de engenharia de petróleo e gás, Destin Konde, 25 anos, é retornar para o Congo, seu país de origem, depois que concluir a graduação na Universidade Federal Fluminense (UFF). Entretanto, ele assegura que a volta não tem data prevista, já que planeja sair do Brasil somente após obter experiência profissional na área. Fazendo um comparativo, o aluno assegura que em termos de incentivo público, o governo brasileiro oferece muito mais subsídios aos estudantes que os governantes africanos. Destin não pretende medir esforços para contribuir com o progresso do seu povo, que ainda sofre com os baixos recursos educacionais.
“Ter acesso a bolsas de ensino em outros continentes é algo extremamente difícil, sobretudo para quem deseja estudar na Europa. Quando soube que uma universidade brasileira havia permitido meu ingresso, decidi abraçar a oportunidade em nome do meu futuro. Não recebo nenhuma contribuição pública e são os meus pais que arcam com todos os gastos, por isso, sinto que tenho a obrigação de levar para minha terra cada aprendizado com o objetivo de beneficiar a sociedade congolesa”, afirma Destin.
Vivendo uma realidade totalmente oposta, a estudante de jornalismo Gabrielle Marrie Lourenço, 20 anos, deixou a França para cursar dois períodos de comunicação social no Brasil. Mesmo tendo a chance de ir para os Estados Unidos ou Austrália, ela optou pelo Brasil devido à curiosidade de conhecer o país do samba e do futebol. Morando há nove meses em Icaraí, Gabrielle não poupa elogios ao povo brasileiro e revela que está encantada com a hospitalidade dos niteroienses.
“Confesso que não esperava ser aceita facilmente, porque na Europa as turmas possuem vários grupos distintos e a socialização nem sempre é tão simples nas salas de aula. Porém, para minha surpresa, fui acolhida e aqui as pessoas estão muito abertas para novas amizades. Como sou intercambista, não posso trabalhar, mas percebo que as empresas estão dispostas a oferecer vaga para os jovens que estão em busca do primeiro emprego e isso é motivador. Em julho, volto para Paris com uma bagagem cheia de experiência”, comemora a francesa.
De acordo com a responsável pela Superintêndencia de Relações Internacionais da UFF, Gabriela Brandão, os universitários estrangeiros que desejam fazer intercâmbio no país devem se inscrever com um ano de antecedência no programa. Ela explica que todo o processo é online, e os interessados precisam apresentar documentos como plano de estudos, carta de recomendação da faculdade e histórico escolar. Após o período de triagem, o coordenador do curso avalia os pré-requisitos do aluno e com o aval da universidade, o estrangeiro recebe o visto de ingresso.
“Ao todo, recebemos, por ano, aproximadamente 150 estudantes do exterior para cursos de graduação, pós-graduação, mestrado e doutorado. Geralmente, o tempo de estadia é de seis meses a um ano, e todos os estudantes precisam se submeter a um exame de língua portuguesa para atestar a proficiência no idioma. Também é terminantemente recomendado que o cidadão obtenha o visto adequado em seu passaporte, ainda que ele seja natural de países vizinhos. Essa permissão deverá ser obtida na Embaixada do Brasil no país de origem do estudante”, esclarece a superintendente.
Muitos alunos têm se mostrado satisfeitos em garantir uma vaga nas universidades brasileiras. Para o indiano Mukesh Kunwar, de 27 anos, o que mais chamou sua atenção nos primeiros meses de aula foi a relação de intimidade entre estudantes e professores. Devido aos costumes conservadores de sua cultura, o doutorando em engenharia mecânica não imaginava que no Brasil teria liberdade de dirigir-se ao educador chamando pelo nome, ao invés de reverenciá-lo como mestre.
Já os estudantes Nádia Gil, 24 anos, Laura Lindholm, 25, Alonso Ahumada, 23, Jesús Rodríguez, 25, e Marrie Solty, 25, são categóricos ao afirmarem que o maior obstáculo que enfrentaram foi o aprendizado da língua portuguesa. Os jovens que vieram de destinos diferentes e são naturais do Peru, Finlândia, Chile, México e Alemanha, respectivamente, se comunicam em inglês. Eles revelam que mesmo após terem feito um curso intensivo de português na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a fluência no idioma é um desafio frequente.
“Os verbos, as terminações e os significados são embaraçosos no início, mas não é impossível. Até quem já conhece o espanhol percebe que a pronúncia não é tão similar quanto parece, porque a gramática portuguesa é extremamente complexa. Mas, decidi me dedicar, já que desejo aprender idiomas que ainda não são referências mundiais,” conta a alemã Marrie Solty, estudante de letras da UFF.
Apesar de o estudo ser o foco principal dos jovens intercambistas, a socialização e a convivência são fatores que contribuem para o nível de satisfação dos estrangeiros durante a estadia no Brasil. Enquanto para alguns, viver em uma república é uma tarefa fácil, para outros o período de adaptação é um momento difícil, que requer apoio e compreensão. Para o americano Alex Norton, 20, que veio cursar um semestre de economia no país, passar uma temporada longe de casa só está sendo simples porque no hostel onde mora, em Icaraí, existe muita cumplicidade entre os estudantes. Junto com outros 20 estrangeiros, estão os brasileiros Rayanne Oliveira, 19, e Glaucio Teixeira, 36, que também estão tirando proveito da experiência, adquirindo fluência no inglês e no espanhol.
“O segredo da convivência está no respeito e na parceria. Todos chegam aqui com determinadas fragilidades e muitas vezes apreensivos sem saber como serão os meses seguintes. Entretanto, essas mesmas pessoas estão dispostas a fazer novas amizades e dificilmente se mostram aversas à nossa cultura ou apresentam comportamento preconceituoso. O importante é contornar as diferenças para que o ambiente não seja apenas um lar, e sim, uma fraternidade”, afirma o proprietário do hostel, Felippe Guido.
Douglas Macedo
(O Fluminense – 01/05/2015)