A transferência de haitianos para o Sul e Sudeste será retomada de modo programado e previamente acertado com os Estados de destino.
O estado do Acre planeja transferir centenas de imigrantes haitianos à capital paulista e à região Sul do Brasil nos próximos dois meses. Um convênio de cerca R$ 2 milhões com o governo federal prevê o custeio para 43 ônibus fretados, que transportarão os haitianos.
De acordo com a prefeitura de São Paulo, 23 ônibus vão seguir para a capital paulista e 20 ônibus terão como destino os estados do Paraná, de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul. Estima-se que 920 haitianos cheguem em São Paulo e 800 desembarquem no Sul.
Em entrevista à Agência Brasil, o secretário Nacional de Justiça e presidente do Comitê Nacional para Refugiados, Beto Vasconcelos, explicou que o deslocamento de haitianos ocorrerá de maneira programada. “Ajustamos que vai ser um fluxo alternado entre os estados, e que será previamente acordado quando for deslocado algum ônibus. Isso deve ocorrer de uma maneira muito sustentável, muito programada entre todas as partes”, declarou.
Nilson Mourão, secretário de Direitos Humanos do Acre, confirmou que o estado emitirá esse aviso. Porém, de acordo com ele, o repasse de verba para a contratação do transporte ainda não ocorreu e, por isso, não há previsão para o início da transferência. Segundo o secretário, diariamente, entre 30 e 50 haitianos compram suas passagens com recursos próprios, e deixam a capital acreana em direção a São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
O padre Paolo Parisi, da Paróquia Nossa Senhora da Paz, é referência em São Paulo na recepção de haitianos. Segundo ele, de oito a nove haitianos chegam diariamente do Acre na sua igreja. “Ontem, chegaram 15 haitianos e sábado, também chegou um novo grupo. Eles continuam chegando, mas com os próprios meios. Conversei com esses imigrantes, eles pagaram do próprio bolso”, disse ele.
Na rodoviária da Barra Funda, zona oeste de São Paulo, existem três empresas atuando no trajeto até o Acre. A reportagem da Agência Brasil conversou com funcionários das linhas, que confirmaram que a chegada de grupos de haitianos na capital paulista é recorrente. A maioria desses imigrantes chega desorientada, sem falar o idioma ou ter dinheiro sequer para se alimentar.
O padre Paolo Parisi disse que o Serviço Franciscano de Solidariedade (Sefras) planeja levar representantes à rodoviária para auxiliar na recepção dos haitianos, orientando para qual abrigo da cidade eles devem ser encaminhados. A prefeitura de São Paulo também informou que funcionários, fluentes em francês e creole ficarão no terminal à disposição dos imigrantes para orientá-los.
Segundo o padre, para atender à demanda de haitianos, dois novos abrigos também serão inaugurados. Amanhã (22), abre um abrigo emergencial, imóvel da própria igreja, a dois quarteirões do metrô Armênia, com capacidade para 50 pessoas. Outro abrigo com 150 vagas vai funcionar no Pari, região central da capital.
A entrada de haitianos no Brasil cresceu a partir de 2010. Segundo o padre Paolo, desde então 10 mil haitianos chegaram ao país. Apenas no ano passado, foram 4,68 mil haitianos e, neste ano, a paróquia recebeu 1,4 mil. Esses imigrantes, normalmente, permanecem em abrigos de dois a três meses, tempo médio para conseguirem um emprego.
O padre Paolo destacou que há 110 anos, 10% da população brasileira era composta por imigrantes. Atualmente, esse percentual caiu para 1%. “Baixou muito, e muitas vezes temos a impressão de que o volume seja enorme, por falta de informação. São números pequenos em comparação com outras realidades do mundo. Então, acho que o Brasil tem toda a condição de dar uma demonstração de boa acolhida diante desses seres humanos que estão chegando”, disse.
Saídas programadas
Segundo o coordenador do abrigo de imigrantes instalado em Rio Branco, Antônio Crispim, dois ônibus com 44 imigrantes cada, devem sair do Acre três vezes por semana com destino a São Paulo e cidades da região Sul do país, como Curitiba, Florianópolis e Porto Alegre. Já nos demais dias da semana, apenas um ônibus sairá, com destino ao sul do país.
Crispim explica que foi a visita do secretário Nacional de Justiça, Beto Vasconcelos, no dia 9 de junho ao Acre, que possibilitou o restabelecimento do transporte de imigrantes. “A partir de agora fazemos um planejamento sistemático para que os imigrantes que saírem do Acre com destino a outras cidades do Brasil cheguem e sejam acolhidos”, afirma.
Ainda segundo o coordenador, mais de 40 imigrantes continuam chegando por dia no abrigo. Destes, cerca de 35 seguem para outros estados do país por conta própria e mais de 80 são levados em ônibus custeados pelo governo.
Organizando seus pertences em uma mala, o haitiano Jacques-Elie Pierre, de 26 anos, conta que está ansioso para embarcar com destino a São Paulo, na sexta-feira (26). Segundo ele, o retorno das viagens com destino a essa cidade, após mais de um mês de suspensão, é uma alegria para os imigrantes que não têm recursos próprios para fazer tal deslocamento.
“É mais fácil para quem tem dinheiro seguir para seu destino, mas a maioria das pessoas é como eu e não tem condições de pagar. Então, estou muito feliz com a volta dos ônibus”, diz.
Pierre conta que veio para o Brasil em busca de trabalho e diz que um irmão já o espera em São Paulo. Ele diz que apesar de não ter nenhuma proposta de emprego em vista, está otimista com a mudança e a possibilidade de melhorar de vida. “Agradeço ao povo brasileiro que tem nos acolhido da melhor forma e sem preconceitos como vemos em outras nacionalidades”, afirma.
Proibição e retorno das viagens
Por determinação do Ministério da Justiça, as viagens de imigrantes para São Paulo foram suspensas no dia 19 de maio. A medida foi tomada depois que a Prefeitura da capital paulista publicou uma nota dizendo que não havia sido informada sobre a chegada de até mil estrangeiros à cidade e que, por isso, não teria estrutura para recebê-los.
Um mês depois, no dia 19 de junho, a Prefeitura informou que esperava a chegada de 23 ônibus com imigrantes à Rodoviária da Barra Funda, Zona Oeste, pelos próximos dois meses.
O fim da restrição foi confirmado pelo Ministério da Justiça, nesta quarta-feira (24). Segundo o órgão, o recurso do novo convênio deve servir para garantir até para 45 viagens para as regiões Sul e Sudeste do Brasil.
(Redação + Agências)