A divergência entre a imagem que o Brasil projeta pelo mundo e a percepção de um imigrante ao experimentar a realidade pode ser explicada pelo conceito de ‘racismo à brasileira’, de Roberto DaMatta.
Uma pesquisa realizada pelo instituto IPSOS, em 22 países, aponta que 40% dos interrogados defendem o fechamento total das fronteiras de suas respectivas nações a refugiados.
A chegada destes e de imigrantes é vista como tendo um impacto negativo para 78% dos entrevistados. É importante ressaltar que a proporção é significativa entre países que estão ligados, diretamente, ao conflito na Síria, por proximidade geográfica ou envolvimento político, como no caso da Rússia e da Turquia. Além disso, a principal justificativa para o fechamento total das fronteiras a refugiados é a preocupação com segurança nacional, sendo o terrorismo e a capacidade de integração com a nova realidade os principais fatores levantados.
O maior apoio de tal medida provém dos Estados Unidos (apesar de ser o país com a segunda maior taxa de percepção positiva a respeito de imigrantes e refugiados), da França e da Alemanha (países com menor proporção de percepção positiva) – nações que têm ampla influência no contexto global e despontam como centrais na crise migratória, com decisões ambíguas envolvendo o atual presidente estadunidense Barack Obama, o próximo, Donald Trump, e a chanceler alemã Angela Merkel.
Já o Brasil, apesar de ser considerado como país receptivo, também apresenta uma das menores taxas de percepção positiva a repeito da imigração. Os dados a respeito das denúncias por xenofobia são alarmantes. Em 2015, as denúncias de xenofobia cresceram 633% em relação a 2014. Por meio da plataforma do Disque 100, a Secretaria Especial de Direitos Humanos recebeu 330 casos.
Apesar de xenofobia ser considerada como crime, tendo como pena reclusão de um a três anos e multa, desde 1997, de acordo com o artigo 1º da lei n. 9.459/97 – “Serão punidos, na forma desta lei, os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional.” –, os casos são negligenciados e ignorados pela Justiça. Em todo o Brasil, há apenas três casos de xenofobia nos judiciários estaduais.
Além do desconhecimento das vítimas sobre os seus direitos, como devem proceder e acompanhar o processo, e o medo de serem deportadas, há, ainda, a incompreensão, por parte das instituições, sobre o que caracteriza o crime de xenofobia. Muitos juristas, delegados e advogados usam em suas argumentações a falta de provas. Imigrantes alegam que as agressões não deixam marcas físicas, mas psicológicas, pois ocorrem por restrições de espaços, humilhações e dificuldades no acesso ao mercado de trabalho por causa da nacionalidade.
Considerando que, no Brasil, a maioria das vítimas é haitiana e composta por negros, outro fator agravante nos casos de xenofobia é o racismo. Em entrevistas concedidas à BBC Brasil para o Dia da Consciência Negra, imigrantes negros relataram a surpresa em descobrir que o Brasil está longe de ser um lugar acolhedor. Segundo Nádia Ferreira, de Guiné-Bissau, e Egide Nishimirimana, de Burundi – país do oeste africano –, a consciência sobre preconceito e identidade raciais foi despertada ao chegarem aqui.
A divergência entre a imagem que o Brasil projeta pelo mundo e a percepção de um imigrante ao experimentar a realidade pode ser explicada pelo conceito de ‘racismo à brasileira’, de Roberto DaMatta. Segundo ele, há um racismo velado com diversas gradações – econômicas, estéticas, raciais, nome de família –, possibilitando esconder uma sociedade altamente hierárquica e desigual por meio de um método sutil. Portanto, torna a injustiça como algo tolerável e exclui a positividade jurídica de que todos são iguais perante a lei.
De acordo com o CONARE (Comitê Nacional para Refugiados), nos últimos quatro anos, o número de refugiados passou de 4,2 mil para 8,4 mil. Os dados revelam a urgência para a adoçaõ de políticas para imigrantes e refugiados mais efetivas, atentando aos casos de xenofobia e racismo, já que os maiores índices de vítimas são haitianos (26,8%), árabes ou pessoas de religião muçulmana (15,45%), ressaltando o preconceito de raça, religião e procedência nacional.
Nathalia Barbosa