O principal ponto de chegada dos imigrantes que aportaram no Rio de Janeiro entre as décadas de 1880 a 1960 é guardado pela Marinha do Brasil e pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro. Uma hospedaria que carrega histórias e uma parte da história de um Brasil de muitos idiomas.
A Ilha das Flores é um pedaço da história da imigração brasileira. Localizada no município de São Gonçalo (a 30km do Rio de Janeiro), a ilha, que não é mais uma ilha devido às grandes obras de aterro em sua estrutura inicial, só recebeu esse nome porque antes de ser vendida ao governo, em 1883, pertencia a Delfina Felicidade do Nascimento Flores.
A ‘Ilha da Dona Flores’ era uma das quatro ilhas (todas tiveram importância para o fluxo migratório) que compunha um arquipélago de cartografia privilegiada para as chegadas das massas imigrantes na capital do Império. Os estrangeiros que chegavam nos transatlânticos eram trazidos em embarcações menores até o local e lá encontravam uma hospedaria que tinha como principais serviços a acomodação, a alimentação e os serviços médicos.
Fique sabendo! Eram considerados imigrantes os passageiros de 3º classe dos navios que aportavam no Rio de Janeiro, obrigando-os a passar pela Ilha para evitar o contágio de doenças propagadas pelas longas viagens.
Para um governo desejoso em “branquear” uma raça majoritariamente negra decorrente do tráfico de escravos, a imigração laboral europeia precisava ser incentivada. No entanto, a fama de “túmulo de estrangeiros” que o país vinha adquirindo pelas moléstias decorrentes do clima acalorado e a baixa higiene local aproximava os europeus de outros países americanos, como os Estados Unidos, o Canadá e a Argentina. Por isso, um serviço de acolhida mais afastado da cidade e com serviços de cuidado poderiam contribuir para a propaganda brasileira.
A partir desse interesse, a hospedaria se transformou em um importante ponto de partida para aqueles que procuravam nova vida no Brasil. Na Ilha das Flores, a semente da esperança foi plantada por muitas histórias registradas pela equipe do Museu da Imigração, coordenado pela Marinha do Brasil (a Ilha “hospeda” hoje a Tropa de Reforço dos Fuzileiros Navais) e a UERJ, por meio do “Grupo História de São Gonçalo: memória e identidade”. Uma dessas histórias é da construção da Capela de Santa Teresa, lugar da presença do sagrado na Ilha, um presente que a esposa do médico João Martins de Almeida ofereceu à santa por graças concedidas. Recebendo também migrantes internos, caso do casal, o médico passou de hóspede a diretor, função desempenhada por dez anos.

Até a década de 1960 a hospedaria contribuiu com um importante serviço de acolhida na história brasileira, especialmente pelos 29 mil refugiados da Segunda Guerra Mundial que aportaram nesse canto do Brasil. O lugar, que tem capacidade para receber até 3.500 pessoas, além de exposto à natureza emana a potência cultural que só um ambiente como esse poderia absorver.
Mas a Ilha e sua hospedaria tiveram outros usos durante a primeira metade do século XX, especialmente como presídio dos revolucionários de 1930. Ao ser desativada, em 1966, a Ilha também chegou a ser utilizada para “abrigar” os presos políticos da ditadura civil-militar (1964-1985). Aí as paredes já guardavam outras histórias.
O Museu da Imigração é aberto de terça a domingo, das 9h às 17h, com horários específicos para visitas guiadas. Caso o grupo seja grande, é necessário fazer um agendamento. A entrada é gratuita. Para agendamento e outras informações sobre a Ilha das Flores, você pode acessar o site aqui.
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Otávio Ávila