Diante de mim há um sujeito. Meu desejo é que ele seja meu sujeito de pesquisa. Mas ele me fita indagando, divaga: o que é ser isso, assim… um objeto de pesquisa?
Proponho que não. Nunca um objeto, sempre um sujeito. Ele tem voz e é ela que quero ouvir. Sinto minha mesquinhez de adentrar na vida do outro, sem ter sido por ele chamada, com meus desejos, meus livros e grandes olhos – que não querem nada perder.
Porém, ao me encarar, o sujeito demarca seu lugar e – inevitavelmente – coloca-me em outro, já diferente daquele de onde comecei a jornada. Então ele vai aos poucos deixando claros os limites, os contornos daquilo que pode ser compartilhado.
Deixo-me afetar[1]. Abruptamente percebo que o que pergunto diz mais sobre mim do que sobre ele. Sorrio envergonhada com minha própria prepotência. Sobre o que ele gostaria de falar?
Não somos neutros, eu e ele, neste embate de ideias que vai sendo construído. Nem poderíamos. Acreditar na neutralidade das perguntas seria tirar de mim a missão última de todo o esforço-transformação. De arrancar do percurso o compromisso ético-político[2] que abraço como meu. Acreditar na neutralidade das respostas – se as perguntas fossem neutras, por que não seriam as respostas? – é arrebatar do outro sua história, já que não há voz que não carregue em si seu próprio contexto, risos e dores.
Diante de mim há um sujeito. E por não ser objeto, convido-o a me ajudar. Prendo a respiração, deixo os ouvidos atentos. Ele aceita o caminhar junto e, então, confere a nós este lugar de dois, que se mesclam sem se fundirem, pesquisador-pesquisado, num movimento contínuo e circular entre papéis.
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Gabriela Azevedo de Aguiar
Psicóloga, professora da Faculdade de Psicologia da UNESA e doutoranda do Programa Eicos / UFRJ. E-mail: aguiargabriela@gmail.com
[1] FAVRET-SAADA, J. Ser afetado. Cadernos de Campo, São Paulo, n. 13, 2005.
[2] CODO, W.; LANE, S. (orgs.). Psicologia Social – O Homem em Movimento. São Paulo: Brasiliense, 2001.
