A religião, ao longo da história, envolveu culturas e a política de diversos povos, sendo intrínseca à sociedade. O leste-asiático viveu relações conturbadas com as religiões cristãs, que foram extremamente rechaçadas e seus adeptos perseguidos. No Japão, o cristianismo só voltou a ser permitido em meados do século XIX, juntamente com a modernização do país. Outro caso foi a Revolução Cultural da China, quando diversas práticas religiosas foram proibidas e igrejas destruídas. 

A política, assim, sempre esteve atenta à diversidade religiosa dessa região do continente asiático. O medo da crescente influência do ocidente promoveu a perseguição às religiões cristãs, a ocultação dessas práticas e a fuga de alguns indivíduos de seus países de origem. Apesar da expansão do cristianismo em países asiáticos, ainda hoje existe uma grande resistência e preocupação de alguns estadistas acerca dessas conversões. Buscaremos aqui observar alguns pontos sobre os fenômenos que englobam esse escopo nas diásporas asiáticas dos séculos XX e XXI.

A diáspora chinesa no Brasil ocorreu em alguns períodos, iniciando com a primeira excursão em solo carioca no início do século XIX e posteriormente a migração mais ampla ao longo do século XX. No período do pós-Segunda Guerra, a adaptação de chineses à sociedade brasileira se deu por um intermédio forte da Igreja católica, como por exemplo através da Missão Católica Chinesa. A também conhecida Paróquia Pessoal Chinesa Sagrada Família, pertencente à arquidiocese de São Paulo, vem trabalhando no acolhimento de imigrantes desde a década de 60, alguns anos após trazer padres chineses para atuar no Brasil. 

A Paróquia Pessoal Chinesa Sagrada Família, também conhecida como Missão Católica Chinesa (MCC), pertence à Arquidiocese de São Paulo (Região Episcopal Sé). Fonte: missaocatolicachinesa.org.br

Ao longo desse período, além de visar a integração dos chineses ao novo país, também foi um objetivo a conservação de alguns traços culturais. Os padres, trazidos pela Missão Católica, foram responsáveis pela criação da primeira escola chinesa em São Paulo e da reunião de um dos maiores acervos audiovisuais e literários chineses na América Latina. Também foi criado um grupo jovem com fins de evangelização, que por conta da proximidade com a colônia acabou virando referência para encontros nessa comunidade.

Além da Igreja Católica, a Igreja Evangélica também se mostra presente auxiliando na adaptação de imigrantes. Não é o objetivo deste texto discutir os possíveis motivos do interesse dessas instituições nesses indivíduos e seus processos de integração à sociedade. Contudo, é interessante pontuar alguns detalhes desse movimento e seus efeitos na manutenção cultural desses sujeitos. 

A religiosidade de países do leste-asiático se construiu de maneira diferente das religiões com base no cristianismo, judaísmo e islamismo. A mescla entre diversas práticas e a assimilação destas à cultura local é um processo relativamente comum nessa região do mundo. Por exemplo: apesar de nem todos se definirem como budistas, é muito comum as práticas ritualísticas fúnebres acompanharem as tradições do budismo. Isso ocorre sem o abandono de tradições filosóficas de movimentos anteriores, como o confucionismo e o taoísmo na China e o xintoísmo no Japão. Em sua maioria, essas populações acabam não reivindicando nenhuma religião para si, mas aceitam em seu repertório cultural diversas manifestações de crenças diferentes.

Mesmo não sendo possível responder com precisão ao motivo de esses imigrantes frequentarem ou se converterem às igrejas católicas e evangélicas, percebe-se a dificuldade cada vez maior de transmissão de valores culturais do país de origem. A relação existente entre essas instituições religiosas e as organizações dos migrantes se diluiu ao longo do final do século XX e início do século XXI. Atualmente, são frequentadas principalmente pelo público jovem, normalmente vinculados a um “ocidentalismo” e cada vez menos ligados à cultura de seus antepassados. O ponto é que nem todos os amarelos que se beneficiaram dessa ligação com as igrejas cristãs necessariamente se converteram ao cristianismo, mas a evangelização desse grupo parece caminhar de maneira mais consistente do que em outros templos ou espaços religiosos. A questão da identidade e do pertencimento se mostra presente, encontrando nesses locais espaços de familiaridade e socialização – não mais limitados aos imigrantes e seus descendentes, mas sim vinculados a uma identificação pela fé.

Referências

ARAUJO, M. S. Cultura acima da Bíblia? História, religião e sociabilidade entre chineses de igrejas evangélicas no Rio de Janeiro. Tese (Doutorado) – Universidade Federal Fluminense, Instituto de Ciências Humanas e Filosofia, Programa de Pós-Graduação em Antropologia, 2014.

COSTA, W. S. R. Religião na perspectiva sociológica clássica: considerações sobre Durkheim, Marx e Weber. Sacrilegens,Juiz de Fora, v.14, n.2, p.03-24, jul-dez/2017

GAUDIOSO, T. K.; SOARES, A. L. R. Entre o Butsudan e a missa: práticas religiosas de imigrantes japoneses no Rio Grande do Sul, Brasil, Amérique Latine Histoire et Mémoire. Les Cahiers ALHIM [Online], 20 | 2010

____. Matriz Paroquial Pessoal Chinesa Sagrada Família. Arquidiocese de São Paulo. Disponível em: <https://arquisp.org.br/regiaose/paroquias/paroquia-pessoal-chinesa-sagrada-familia/matriz-paroquial-pessoal-chinesa-sagrada-familia>

____. Histórico da missão católica chinesa. Missão Católica Chinesa. Disponível em: <http://www.missaocatolicachinesa.org.br/page27/page32/index.html>