De acordo com o relatório do Perfil Sócio Econômico dos Refugiados no Brasil realizado entre 2018 e 2019 pelo Alto Comissariado das Nações Unidas – ACNUR (ACNUR, 2019) em um estudo realizado com 500 entrevistados de 14 diferentes cidades (São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná, Rio Grande do Sul, Distrito Federal, Santa Catarina, Minas Gerais e Amazonas), 57% dos imigrantes refugiados estavam trabalhando, 19,5% estavam procurando trabalho – índice de desemprego mais elevado que a média nacional – e 5,7% estavam desocupados, ou seja, não estavam empregados nem procurando emprego. Sendo assim, 25,2% estavam fora do mercado de trabalho. A disparidade apresentada por este grupo amostral mostra que há um grande número de pessoas que ainda não estavam inseridas no mercado. As atividades de autoemprego, como salientam Cruz, Mancebo e Falcão (2018), destacavam-se como solução e faziam surgir um novo contexto de imigrantes com potencial de geração de renda, emprego e desenvolvimento.
Os dados da pesquisa citada acima apresentaram um total de 4,1% de imigrantes refugiados empregando um ou mais trabalhadores em sua atividade empresarial, sendo este comércio estabelecido com sede física (imóvel comercial ou em sua própria residência), e 17,9% trabalhando por conta própria. Ao total são 22% dos entrevistados em atividades empresariais.
Se este era o cenário em 2018 e 2019 anos de realização da pesquisa, em 2020 o Covid-19 trouxe impactos profundos no mundo do trabalho para todos os trabalhadores sendo eles imigrantes refugiados, ou não. Segundo Ricardo Antunes (2020), a pandemia desnudou a forma como o capitalismo vem se apresentando no século XXI, ou seja, uma forma de trabalho pautada na combinação entre um auto índice de digitalização, as tecnologias de comunicação e informação e este empurra a classe trabalhadora para a flexibilização, para a terceirização e para a informalidade e a intermitência.

Não é à toa que os dados de maio de 2020 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE para os trabalhadores que ficaram sem remuneração durante a pandemia foi de 9,7 milhões.
Segundo Antunes, a pandemia ocorre em um momento que existem 40% de trabalhadores na informalidade no Brasil sem direitos àquilo que o trabalho assalariado fornece, nem mesmo a uma legislação protetora.
A reportagem A saúde de migrantes e refugiados no contexto da pandemia do coronavírus para a Veja Saúde, em julho deste ano, informa que em grande medida os migrantes se inserem no mercado de trabalho dos países de residência de forma informal e, quando formalizados, executam, na maioria das vezes, trabalhos considerados essenciais.
Nós, do grupo de pesquisa Diaspotics, pudemos presenciar este acontecimento em relação ao grupo de imigrantes refugiados, pois muitos que eram empreendedores tiveram o impacto em seus negócios provocando uma aceleração na busca de aplicativos e outros caminhos para continuar sobrevivendo em meio aos impactos da crise.
Para Antunes, a crise criou dois grupos para o trabalhador. Um grupo que já tinha alcançado um espaço mais qualificado de trabalho, que tem condições de trabalhar remotamente e viver em isolamento social e que, mesmo com a redução da jornada de trabalho e do salário, irão conseguir superar o momento e; por outro lado, um segundo grupo à margem do digital e que irá crescer devido à pandemia.
Não sabemos ainda ao certo a qual dos dois grupos os imigrantes refugiados pertencerão, mas a probabilidade é que este, sem o apoio da sociedade e de uma rede no país de acolhimento, poderão pertencer ao grupo que estará à margem do digital onde a ilegalidade de um trabalho sem os recursos de uma legislação trabalhista prevalecerá.
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Flavia Arpini
Psicóloga, mestranda em Psicossociologia de Comunidades e Ecologia Social pela UFRJ e membro do Diaspotics.
Referências:
Antunes, R. (2020), https://www.brasildefato.com.br/2020/06/27/ricardo-antunes-pandemia-desnuda-perversidades-do-capital-contra-trabalhadores
Antunes, R., (2020) https://valor.globo.com/carreira/noticia/2020/06/22/precisaremos-repensar-o-futuro-do-trabalho-no-pos-pandemia.ghtml
Cruz, E. P.; Mancebo, R. C. ; Falcão, R. P. Q. (2018). Empreendedorismo imigrante no contexto dos haitianos em Maricá: reflexões e propostas.
IBGE – https://www.ibge.gov.br/